20.3.08

mudança no olhar

ele é feio como uma mesa de centro. era isso o que as amigas do caminho das pedras diziam a Valesca. mas Valesca nem achava mesas de centro feias.

terceira pessoa do singular [II]

no meio dos papéis mortos, lá estava ele. por um descuido, quase achei que ele estivesse morto também, e com os outros finados iria para o reinos dos papéis que já cumpriram sua missão no mundo. mas lá estavam lá: "3ª pessoa", "como se escreve 'amar' em japonês?". e era uma escrita atemporal; não era minha letra de fevereiro, de dezembro ou de qualquer outro mês de letra. mas estavam lá, e foi tudo antes do dia em que levantei um pé do chão da primeira vez. é, foi antes, e eu já escrevia os textos com o sorriso dele, as roupas dele, a rua dele – e eu nem percebia que os textos dos outros eram, no fim, dele. e hoje, quando acho que ele já era, talvez os novos olhos sejam, na verdade, os dele.

terceira pessoa do singular

como se fala 'eu te amo' em inglês? e em espanhol? terceira pessoa do singular perguntava isso quase sempre quando nos encontrávamos. eu dizia: 'i love you', 'te quiero', 'te amo', terceira. ela não parava de pensar: será que 'love' é a mesma coisa que eu sinto quando amo? e será que o que sinto quando amo é a mesma coisa que se sente quando se ama?

eu nunca soube da resposta. até tentei pesquisar de forma séria/acadêmica; até, quem sabe, iniciar uma pesquisa científica. mas qualquer bibliografia consultada, qualquer tentativa de apreensão me remetiam à terceira pessoa. e então, no fim, eu apenas ficava com um sorriso pueril e as mesmas roupas de sempre.

15.3.08

e. matoso; kyoto

inventei mentira qualquer, fui embora. a ginástica labial não deve ter sido das mais convincentes, mas tentei até a esquina, quando o público foi embora e pude fazer do automóvel espaço privado.

é triste. até hoje.

13.3.08

Vem cá, vem cá, me diz. Não. Não vem, não diz nada. Desculpe. Tem dia em que eu mudo rápido de idéia. E. Eu que não sei por que falo as coisas. Às vezes, solto pedaços que acabam dizendo além de mim, sabe, que aqui dentro diziam outra coisa, como se fossem quadrados formadores do todo, que, fora, formam uma coisa estrangeira, alheia, aleatória. Você não seria capaz de me dizer por que tanto tem vindo para o transtorno, é difícil saber. Um. Mas eu queria. Já passei daquela fase de querer saber tudo; talvez esteja na fase de querer saber todo, mas não de saber tudo, isso é ingenuidade. Vem e me diz, e me diz, agora eu quero saber, e me diz, o que pode ser do que vai ser, eu quero saber o que se passa dentro.