28.4.08

é o trabalho burocrático, nas noites de segunda-feira depois da carne vermelha e dos grãos de feijão, o ato de se levar o lixo para fora, e, no fora, a rua vazia. esquisito, porque às oito e pouco, quando voltei, ela ainda estava cheia. são as pessoas que devem ter essa síndrome das dez. e some tudo. eu gosto das dez.

22.4.08

eu contaria que comi um ovo frito, mas este texto tem a pretensão de ter um quê de melancólico, porque às vezes se senta e se quer escrever o que vem de dentro, e o que vem de dentro é a melancolia dos dias em que não se quer ser o mesmo, mesmo sendo o mesmo, o mesmo usando os tênis gastos do ano passado. falar sapatos seria mais melancólico que falar tênis – ou ovo frito – mas o tênis é de verdade.

e é a felicidade que deixa tudo assim. ou meio assim, do avesso, maltrapilho.

16.4.08

do batido e do ciro

seu c., também tem uma pedra no meu caminho. não é das pedras das mais bonitas e virtuosas, sabe, mas é muito valiosa, porque achar uma pedra não tão bela e cheia de imperfeições é coisa rara nesta vida. me disseram há um tempo (não lembro se foi o senhor) que oportunidades têm de ser agarradas nesta vida, ou, se utilizassem um trem como oportunidade, você tem de pegá-lo, porque ele nunca mais volta. eu nem sei se essa pedra, se esse trem pode ir logo e nunca mais voltar, nem sei se devo pegá-lo e ir a um destino desconhecido só para agarrar a oportunidade, porque é assim: pode vir coisa melhor, por mais que seja tudo isso um tudo bom, sabe? ou pode ser também aquela frase-kaufman, ou aquela frase-muitos, de um olhar que te olha e você se apaixona porque te olha. e esse olhar pode ser nada intencional, porque quando cai a árvore e eu me interesso por ela, isto, sim, é comunicação, e eu não sei se quando eu caio por alguém é comunicação; talvez seja se eu começar a misturar todas as teorias e dizer que quando a pedra me aparece no caminho é um acontecimento, e, sim, isso sim é comunicação.

4.4.08

Um sem-número de passos

I
Desliguei o telefone e nada me guiava. Inventei desculpa qualquer para ficar só e andei. Garoa era fina. Eu quero sentar, pensar. Refazer mentalmente o caminho do diálogo – os horário de antes, de depois. Refazer mentalmente o caminho da relação: os humanos que formam fios entre si e que precisam andar sob uma linha-guia no chão para que ele, o fio, não se rompa.

II
Era um boteco da Augusta. Eu podia escolher dois tipos de bebidas: as que levam para dentro e as que levam para fora. Optei pelo primeiro tipo, e me veio um café expresso às dez e meia da noite. Fantástico na televisão; e, se você quiser, a gente pode falar de sacos plásticos: eu tento evitá-los, e muita gente não entende, não entende, não entende – são tão práticos! Quando acaba o café, e olho para a xícara, marca de borda poética. No fundo, resto de pó e doce. Parecem estrelas. O que dizem elas sobre mim? Meu futuro: minha casa, meus pares, minhas maçãs e pêras da fruteira. Ou talvez elas digam que devo me levantar, fingir que nada aconteceu, tirar o cabelo da testa e caminhar e. Não-não-não. Não sei o que me diz essa versão ocidental da borra no fundo da xícara. Eu mexo o ar com a colherinha enquanto olho o meu futuro, e eu nem presto atenção no futuro, eu apenas mexo o nada, eu olho o nada, eu não estou bem, não, não estou bem. E passa o garçom uma, duas, três vezes; talvez ele queira ir embora, talvez seja melhor eu ir embora.

III
A chuva aperta. Me abrigo perto dos que esperam o ônibus chegar. Eu espero um ônibus que nunca vai chegar, nunca-nunca-nunca. Olho para aquelas pessoas que querem estar logo em casa. Olho a água em linhas finíssimas vindo de cima. Quando o ponto esvazia, sento no degrau de um comércio. Eu e meu capuz do moletom. Guardadora de carros começa a falar com jovem ao meu lado. Ouço ela, ouço eu, e fim. Talvez agora eu não queira mais ficar olhando, vendo as pessoas passarem e tentando refazer tudo mentalmente. Olho o relógio de rua, lá em cima. Ainda há tempo, ainda há, não sei o que fazer.

IV
Resolvo fugir. Fugir. Isso até às 3h e pouco, quando me vou. Com cuidado.

1.4.08

extremidades avermelhadas; as pontas, os tocos, as rugas. está frio, 'cabei de correr, com gripe estou. desde já.

gosto assim.