24.11.08

Senado Federal aprova... William

Foi aprovado no Senado o projeto de lei que impede que duas pessoas utilizem um mesmo perfume. Se poder William tivesse, exigiria: peles devem ter cheiros diferentes; o uso de cheiros artificiais devem ser exclusivos. Na última segunda-feira (22), W.D.S. percebeu um corpo mover-se atrás de si. Veio o aroma de braços e pernas com lençóis, noites quentes sob prédios, ventanias. "É o mesmo produto que vai me perseguir pelos anos", afirma. Porque o produto usado foi o mesmo, sabe. William, portanto, gostaria que eles, os produtos, fossem expurgados, para alimentar a ilusão de que se pode arrancar as linhas do pensamento em que uma pessoa está presa, uma pessoa presa nos fios de outra; arrancado este naco, um buraco ficaria na linha do tempo, seria o trecho censurado da biografia autorizada, sobretudo se ele se desse ao luxo de realizar a loucura de comprar o mesmo produto e, com ele, passar a viver, da mesma maneira que fez com jaquetas. "Quando o pensador me chegou, eu o cheirei", revelou. E o trecho censurado, de novo, lhe veio. William perguntou ao assessor quanto tempo o cheiro do produto demoraria para se dissipar, ao que não houve resposta. "Posso caminhar sem estar em estado de sítio?", questiona.

21.11.08

Ali, o piano acalentava. Era céu cor cinza, sangue nas costas, dor, mas o piano acalentava. E o desejo era que a cabeça também sangrasse, que dela saísse tudo que estava empilhado, entalado, entupido, estocado, e ela crescia, e crescia mais que qualquer outra parte do corpo, enquanto o piano acalentando.

O suposto era que uma aula acontecia, posto que, vez ou outra, alguma tecla era pressionada de maneira equivocada, e isso irritava a cabeça que crescia. E crescia.

Era dor necessária. Era preciso que doesse, porque senão não teria como alinhar e limpar. Então a escolha era doer ou alinhar, limpar ou deixar apodrecer. O piano.

Na noite de ontem, não houve piano. Não era o atemporal ou o que lembra um passado que não existe, mas foi um corpo que existia, inclusive, antes de existir em um formato não-corpo em mim, ou na cabeça que crescia.

Quando se surge de outro modo, não-corpo, é mais difíci. Imagina-se, constrói-se, destrói-se, se vê que é outro um que vem, vai, fica, parece que fica para sempre, e nem sei se é bem assim, porque nunca foi antes, nunca será depois e não há como saber o que tinha que ter.

Foram fios de fones de ouvido - brancos - que atrapalharam. E não fui eu que me aproximei. Era um pouco úmido, os fios atrás também úmidos, com espírito da competição consigo mesmo sobre o negro. E o inodoro.

16.11.08

Sobre passos

Quantos foram? Não sei medir em passos – nem por estimativa. Posso dizer que foram, assim, uns 15 quarteirões de pensar – daria umas duas ou três páginas, que já foram para o espaço, e muita, mas muita bateria de música e um tempo para o cinema – e, confesso, muitos para o cochilo. Também teve o tempo para o alimento e para o banheiro, porque sou vivo, mas só.
..
Como viver em dez passos. Como fazer as coisas corretamente para não tropeçar no final.
..
Vou caminhar mais um pouco. Cansei desse lugar.

7.11.08

o menino cansou de esperar. eu já tinha o visto antes.

..
aquela vez, nesse mesmo lugar, dei oi à menina. era verão de ir ao cinema de ônibus, e o cabelo dela estava em desordem. você está diferente, eu disse. deve ter sido a Bahia, eu não disse. mas hoje entendi; hoje, primavera.

olhei no espelho do shopping, e meu cabelo lembrava ela. é o tanto andar, eu não disse, mas pensei, enquanto tentava, em vão, o ajuste. é o subir e descer as ruas, dobrar as esquinas e parar nos semáforos. descer aquela rua, nome feminino, pro lado de lá, me lembra os Dandy Warhols, eu diria, como se ela não estivesse tão longe.
..
voltando para casa ontem me identifiquei violentamente com Marisa. é a esperança. o andar é por isso.
..
hoje preciso de outra coisa, não de um monte de coisa.

-- - -- - - - - - - --

funciona como se as palavas ficassem lá dentro, soltas e dispersas
de repente, algumas voltam à garganta, dói dentro
engolidas de novo, ficam por um bom tempo
então você tenta tirar tudo de vez
não dá
então você escreve


o alívo, espera ele, é para sempre
por isso cliquei em 'enviar para sempre'
mesmo com todos os riscos para a humanidade vindoura

---- --- ---- ---

estou me despedindo. esse modelo, talvez, tenha sido esgotado. mas vou espremer até a última gota e me vou, porque, pela primeira vez, perdi o leitor-modelo.

3.11.08

fim de dez

para eles deve ser fácil, eu não disse. mas só de estar perto da clareira, com pouco verde, tudo branco, eu já me sinto bem. e não foi a primeira vez. lembra aquele tempo, a tantos quilômetros da cidade? eu no telefone tentando falar com o santo que nunca atendia, e você passando para espiar, feito criança. é que tudo que você faz vai ser feito criança, vide seu rosto de anos antes. mas eu devia ter me aproveitado da fragilidade de subir a escada com canas e limões, porque, quando peguei no seu braço, você disse que estaria mais tarde na escola, mas mais tarde seria o não-dia; foi quando eu tirei seu anel e levantei sua franja. como muda.